quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Professor Ênnio Amaral, um precursor na eletrificação rural no Brasil. – Terceira Parte.

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Terceira Parte:



O grande legado.

Acredito que a consciência crítica de Ênnio Amaral, como educador de uma instituição técnica e como cidadão capaz de perceber as necessidades que o rodeavam, permitiu sua intervenção para mudar a realidade posta em uma região da metade sul do Rio Grande do Sul, que se estendeu por outras regiões. Penso que a clareza de pensamento desse homem sobre as possibilidades de uma tecnologia econômica e de custo reduzido, para mudar o seu entorno, é que permitiu a realização e conseqüente aplicação desse conhecimento, em forma de um trabalho de extensão.” – Prof. Nei Carlos de Moura.

O professor Ênnio de Jesus Pinheiro Amaral é uma personagem que faz parte da história da Escola Técnica de Pelotas (ETP), Escola Técnica Federal de Pelotas (ETFPEL) – depois Centro Federal de Educação Tecnológica de Pelotas (CEFET-RS), atual Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-rio-grandense (IFSUL) – como também da região sul do Estado do Rio Grande do Sul.
É notória a utilização de suas pesquisas em projetos de eletrificação rural a baixo custo em, praticamente, todo o território nacional e até mesmo fora do país, beneficiando as comunidades rurais, notadamente aquelas de baixo consumo e baixo poder aquisitivo, que formam a maioria dos consumidores dessa categoria de consumidor de energia elétrica.
Um dos muitos feitos do Prof. Ênnio Amaral, verificando que o mercado de trabalho, em seus diversos segmentos, ressentia-se de profissionais de nível técnico – voltados para a manutenção elétrica e mecânica, mas que também pudessem operar, projetar e supervisionar sistemas de produção industrial – foi apresentar, à comunidade,a criação do Curso de Manutenção eletromecânica, em 1973, iniciando suas atividades em 1974. O professor foi seu coordenador até 1977.
As pesquisas aplicadas e informações que possuía, relacionadas à eletrificação rural pelo sistema alternativo, foram explanadas em Brasília, na Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara Federal, no dia 30 de maio de 1979. O prof. Ênnio se fazia acompanhar do Prof. Sebastião Ribeiro Neto, Vice - Diretor daETFPEL.
Nas fotos que se seguem, feitas no aeroporto de Brasília, temos a FIG. 1, que mostra o câmera men, o Prof. Sebastião Ribeiro Neto, a repórter Ana Amélia Lemos, da TV Gaúcha, e o Prof. Ênnio Amaral.
A FIG. 2 mostra, ao centro, o Prof. Ênnio Amaral e, a sua esquerda, o Prof. Sebastião, sendo que o fotógrafo impede que se vejam alguns membros da Comissão, ao fundo, ao lado do Prof. Ênnio. Na FIG. 3, veem-se membros da Comissão de Ciência e Tecnologia e, na FIG. 4, vê-se o Prof. Ênnio Amaral discorrendo sobre suas pesquisas.
Essa ida à capital do País, do Prof. Ênnio, acompanhado do Prof. Sebastião, repercutiu por quase todo o Brasil. Vários meios de comunicação anunciavam um novo Sistema de Eletrificação Rural a baixíssimos custos; outros chegaram mesmo a colocar abaixo do Título da matéria o ovo de Colombo.
Dias após a apresentação do Prof. Ênnio na referida comissão, o Deputado Hugo Rodrigues da Cunha (ARENA-MG, 1979) discursou na Câmara sobre o tema eletrificação rural. Considerando a relevância para este projeto de pesquisa, cito parte do discurso, pois nele estão inscritos alguns cenários do País à época;

(Senhor Presidente
Senhores Deputados
Por vocação voltada para os problemas do campo, temos notado que a carência de conforto, de assistência escolar e de saúde, além de outros fatores ligados à própria condição de trabalho penoso, têm sido os motivos do êxododo Trabalho rural para as Grandes cidades. [...]. Entendemos que, para a melhoria das condições do homem do campo, [...] a ENERGIA ELÉTRICA significará o grande passo do progresso rural, [...]. No entanto, dentro das normas atuais que exigem o emprego do cobre ou alumínio, em constante alta de preços, além de pequena distância entre os postes sustentadores das linhas, tudo encarece sobremodo a construção desses melhoramentos.
Eis que, na Comissão de Ciência e Tecnologia, tomamos conhecimento dos experimentos dos Professores Sebastião Ribeiro Neto e Ênnio Jesus Pinheiro, da ESCOLA TÉCNICA DE PELOTAS, que, por recomendação do prezado colega, Deputado Alexandre Machado, nos trouxe a revelação de que é possível a utilização do fio de aço galvanizado para a condução de energia elétrica. [...] é muito importante registrar ainda que a mesma Escola tem construído um transformador de 1 kVA, no valor irrisório de pouco mais de 3 mil cruzeiros, [...] o menor transformador atualmente produzido, de 5 KVA, custa Cr$ 45.000,00; Quando tomamos conhecimento desse trabalho, promovemos o comparecimento dos professores da Escola Técnica dePelotas a Belo Horizonte. [...] Será que o nosso país adotando as chamadasNormas Técnicas Brasileiras, que de nacionais não têm senão o nome, não estará apenas fazendo há tantos anos o jogo dos países exportadores, muitomais ricas, que nos mandam normas técnicas excessivamente rigorosas,um “luxo” de tecnologia, quando poderíamos, sem maiores inconvenientesdo que enriquecer sempre as multinacionais e os centros de decisãoestrangeiros rever todas estas normas, dentro de um programa espartano, colocado na realidade nacional [...] quem sabe idealizando nossas própriasnormas e criando tecnologia, a exemplo do Japão que constrói lages em que o ferro de construção é substituído por bambu?!... Fica o alerta, [...] porqueo Brasil tem pressa! Porque é preciso levar AGORA inovações ao campo,rompendo a rotina e os conceitos tradicionais, calcados nem sempre na racionalidade, no realismo da nossa extensão territorial, no realismo danossa carência de desenvolvimento (arquivo do IFSul, pasta: eletrificação rural, grifos do Prof. Nei Carlos).


No dia 16 de maio de 1979 (FIG. 5), o Diário Popular publicou Eletrificação rural com fio de aço tem dimensão nacional. Tratava a matéria da inauguração de uma rede troncal construída pelo sistema convencional, mas contendo três ramais, dela derivados construídos pelo Sistema Monofilar com Retorno por Terra (MRT), cujos condutores eram fios de aço (arame liso de alambrado).
A matéria, pela primeira vez em meios de comunicação de massa, tratava de uma tecnologia que órgãos de governos, entidades de classe e outras instituições e, até mesmo pessoas físicas, viriam, ao seu devido tempo, contestar, tomar para si a sua difusão, impedindo a sua divulgação e o seu emprego, principalmente no Rio Grande do Sul, mesmo que tecnologia similar já fosse empregada em outros países.
Nessa perspectiva, percebe-se que as pesquisas do professor Ênnio e seus pares da comissão da ETFPEL começavam a ser reconhecidas pelos órgãos governamentais, notadamente pela Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE). A primeira vez em que se noticia algo sobre construção de redes rurais, em sua totalidade, pelo processo desenvolvido pelo Prof. Ênnio, data do dia 21 de março de 1979, cuja matéria intitulava-se: Piratini será o primeiro município da Zona Sul a receber novo processo de eletrificação rural.
Era o início das primeiras tratativas de implantação do denominado Projeto Piratini, que envolvia uma extensa área rural a ser eletrificada. Na FIG. 6, abaixo, à esquerda está o Prof. Sebastião R. Neto, representando a direção da ETFPEL; em pé, o Prefeito Paulo Goularte Borges, um membro Diretor da CEEE, o Prof. Ênnio Amaral, e, também, outro Diretor da CEEE.

O Prof. Ênnio iniciou suas pesquisas no início da década de 70, conforme a publicação Fios e Cabos de Aço Galvanizados nos Processo de Eletrificação Rural, ETFPEL, 2ª Edição (1979), na qual, em seu prefácio, justifica tal pesquisa dizendo que;
A eletricidade constitui-se em nossos dias na mais importante forma deenergia a serviço do homem [...], é necessário reconhecer que sua utilização tem sido um privilégio das comunidades urbanas, ficando o meio ruralalheio aos benefícios. Era chegada a vez da eletricidade ir ao campo,descerrando novos horizontes à economia agropecuária [...]. É a técnicasendo transformada em progresso e bem estar. Diante de toda gama depossibilidades, professores e alunos [...] empunharam as ferramentaspor serem co – participantes desse arrojado plano de levar a tecnologia ao homem do campo substituindo técnicas primitivas. E fomos bem
sucedidos. Nosso ponto de partida foi a sala de aula [...]. Vimos que nãohavia mais lugar para estimularmos o consumo supérfluo da energia.
Motivados pelo êxito dos estudos desenvolvidos, sempre alicerçados embases científicas, passamos a acompanhar os resultados das instalações.
[...]. Contamos com a confiança da firma coronel Pedro Osório [...], atravésdo Sr. Luis Osório Reichsteiner Filho, Diretor de Produção [...] projetei econstruí uma rede elétrica [...] no ano de 1973 [...]. O espírito da pesquisa,
da crítica construtiva e do encaminhamento de soluções deixa transparecer,assim, o patriotismo sincero e conseqüente de que é imbuída esta publicação. [...] uma atuação mais constante [...] dos técnicos da Escola
Técnica Federal de Pelotas junto aos setores da Companhia Estadual deEnergia Elétrica, onde reuniões foram uma constante. Destacam – se osencontros com os Chefes Responsáveis pelas gerencia Regionais de Pelotas,Camaquã, Bagé, e Subgerência de São Lourenço do Sul [...] o incentivodo Engenheiro Cláudio Fernandes Barbosa, Presidente da CEEE. [...] ao qual presta sua homenagem muito especial. Escalando os muros de seu
academicismo exclusivo, a ETFPEL orgulha – se em incentivar a práticado binômio “ensino – pesquisa” [...] para fixar o homem do campo em seupróprio ambiente [...]. Atuando sem sair do solo que o viu nascer, onde
formou seus princípios, espera-se, possa ser no amanhã, mais útil ainda,tal como hoje, é bem mais atuante do que o foi ontem (grifos Prof. Nei Carlos).


A primeira que foi construída no Municipio de Herval do Sul  em 1979 cujo ramal era de aproximadamente 10 Km.
Na FIG.7, pode-se ver a placa colocada por ocasião da inauguração da rede de Herval do Sul. Na FIG. 8, o Prof. Ênnio, ao centro, aponta um transformador; a sua direita, o Prof. Sebastião R. Neto. O Prof. Ênnio explanava sobre redes rurais e unidades transformadoras de pequena potência, para prefeitos da zona sul e técnicos da CEEE.


A construção de uma pequena rede de alta tensão (em torno de 6 Km), em 1973, alimentava um pequeno transformador de distribuição de 5 KVA, na granja Coronel Pedro Osório – Industrial, Comercial e Agrícola, gerenciada, então, por Luis Osório Reichesteiner Filho, Diretor de Produção. O diferencial dessa rede é que ela era composta (sob o olhar do leigo) por apenas um condutor ou fio elétrico e, além do mais, o material usado como condutor não era cobre nem alumínio (condutores normais para redes e instalações elétricas), materiais considerados de alto custo e, na sua maioria, importados.
O material usado como condutor era o aço, precisamente um fio dearame galvanizado, liso, usado na construção de alambrados, de custo baixo.
Naturalmente, o outro condutor era a própria terra, SISTEMA MRT – também conhecido por Sistema Alternativo de Eletrificação Rural e Sistema ETFPEL; para muitos rurícolas as rede do Professor; para seus íntimos, as redes do Tio Ênnio. Mais tarde, a Siderúrgica Belgo Mineira, orientada pelas pesquisas da ETFPEL, passou a fabricar fios de aço com alto teor de carbono e dupla galvanização, além de um cabo de aço de três fios trançados (3 x 2,25), usados como condutores nas redes de alta tensão.
O projeto do professor Ênnio desenvolveu a técnica de como construirredes de alta tensão, bem como seus acessórios, mas com baixo custo, isto é, o professor estava procurando desenvolver uma tecnologia acessível aos cidadãos de baixa renda, de acordo com o momento econômico que o nosso País atravessava. Elucidando as afirmativas, consta no Jornal O Estado de São Paulo, em 31-05-1979, dia em que o Prof. Ênnio palestrava em Brasília. 

Fig. 10 Arquivo de artigo da CEEE instalação rural com linha MTR em comunidade do MST.
A construção das redes propostas pelo Professor envolvia, a partir de estudos de publicações que versavam sobre tais redes, pesquisas técnicas sobre a construção de redes com todos os equipamentos desenvolvidos, colocando-os sob a forma de pesquisa aplicada.
 Estava, portanto, o Prof. Ennio Amaral, juntamente com toda a comissão de pesquisa, desenvolvendo uma nova tecnologia. Sobre técnica e tecnologia, vejamos o que diz Raymond Williams (apud KOBER, 2004,).

A construção das redes por processo de mutirão, da maneira como foi pensada, articulada, concebida e materializada, também constituiu um tipo de tecnologia.
É um produto que, se utilizado, transforma a realidade social do local ou região, evidenciando os estudos auferidos no subtítulo sobre extensão universitária.

 Matando a cobra e mostrando o bicho o morto, para não deixar duvidas de quem foi o precursor;
 Desenho básico do trafo monobucha para instalação do trafo junto ao medidor e quando o medidor fica distante.

Ademar Bartell diz;

- “Meu irmão João Bartell, fazia parte da equipe do Prof  Ênnio que desenvolveram um sistema de eletrificação rural, usando poste de madeira trabalhada, da própria propriedade rural e com somente um condutor, não sei detalhes técnicos, mas a idéia dele foi comprada por diversas cooperativas e meu mano foi para Taquarí e Palmares, trabalhar com essa tecnologia. Certa feita ele foi em Curitiba apresentar o projeto...”

Ledemar Neutzling diz;

A primeira linha de transmissão de energia com arame galvanizado foi no interior de Herval, varias fazendas do Cerro Chato, distrito de Herval ainda contam com esta eletrificação, por um bom tempo havia uma placa  na bifurcação da estrada de acesso ao  Cerro Chato, dando ciência do fato, e do seu criador Prof. Ênnio Amaral, esta rede servia a fazenda São José do Sr. Gilberto do Amaral Isaacsom, ode tive o prazer de trabalhar ,na manutenção da fazenda por mais de 20 anos.

Professor Gilfredo Renck diz em seu artigo no Diário Popular;

“- Movidos pelo idealismo, a perseverança e o senso teórico-prático desse mestre, um grupo de educadores da ETFPel, muitos ainda em atividade no Cefet-RS, embasou estudos de viabilidade técnica e econômica e, com o aval de inúmeros municípios da Zona Sul - tais como Herval, Piratini, Canguçu, Pedro Osório, Jaguarão, dentre outros - concretizou várias redes de eletrificação rural (mesmo vencendo as adversidades impostas pela CEEE ).

Nos dias de hoje, algumas concessionárias tratam de modo diferente e seletivo tal aplicação, levando em conta aspectos de segurança, desbalanciamento de carga nos alimentadores, atuações dos novos relés de proteção diferencial e fuga a terra e até, pelas velhas questões de custos em que a partilha é menor para interessados, afinal o programa federal “Luz para Todos veio injetar recursos neste setor e aí é dinheiro do povo...

O Mestre Prof. Ênnio Amaral teve seu passamento em 17 de agosto de 1985, às 19 horas, em Pelotas, no Hospital Sociedade Portuguesa de Beneficência. Contava com 49 anos de idade. Deixou a esposa, Maria Ieda Sedrez Amaral, e os filhos, Daltro de Jesus, Pura, Virginia, Eugênio, maiores de idade, e Sylvia, com 20 anos, Marta, com 16 anos, e Felipe, com 11 meses de idade.
 As duas cidades de sua região homenagiaram-lhe dando o nome de ruas.
Piratini;
Herval;

Ao “Mestre com carinho”! Espero que, com estes tópicos a verdade possa ser desvendada a frente de todos e restabelecido mérito a quem de direito.

 Fonte : Revista Thema | 2011 | - Artigo do Professor Nei Carlos de Moura.
Meus agradecimentos ao Prof. Nei Carlos de Moura pelo brilhante trabalho e artigo escrito em que me baseei majoritariamente.

A família Amaral por ter autorizado escrever estes tópico, principalmente na figura de Virginia Amaral. Agradecimentos pelos comentários carinhosos de Pura Amaral, os netos Ênninho Amaral e Camila Amaral e do sobrinho neto Luciano Manetti.

Aos irmão ETEPEANOS do Grupo do Yahho e do Facebook pelo incentivo, ajuda e colaboração direta.

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