Interessante série de artigos publicas pela revista eletrônica Inovação Tecnológica
O primeiro publicado em 12/07/2016
Laboratórios subterrâneos
Parece-lhe que, para desvendar os segredos do
Universo, os cientistas devam sempre se voltar para
o espaço?
Nem sempre. Na verdade, muitas vezes é melhor
fazer o caminho inverso, mergulhando
profundamente na Terra. Por isso, nasceram os
laboratórios mais profundos do mundo, a maioria
mergulhados em minas que já exploraram todo o
minério disponível, deixando apenas um buraco - um
buraco muito útil.
Detector Super-Kamiokande: o equipamento é constituído por um tanque de aço inoxidável com 50 mil toneladas de água. E cerca de 11 mil sensores.[Imagem: Kamioka Observatory/ICRR/University of Tokyo]
Ocorre que uma chuva de partículas subatômicas de alta energia cai constantemente sobre a Terra. Criada a partir de interações dos raios cósmicos na atmosfera superior, essa garoa invisível cria uma barulhenta radiação de fundo que obscurece as assinaturas de novas partículas ou forças que os físicos procuram.
A solução é mover os experimentos para debaixo do
melhor guarda-chuva natural que temos: a crosta
da Terra. Laboratórios subterrâneos, embora difíceis
de construir e de acessar, são locais ideais para a
observação de interações entre partículas raras. As
rochas protegem os experimentos do chuveiro de
partículas inoportunas, impedindo que coisas como
múons interfiram nos resultados dos aparelhos.
Nas últimas décadas, os laboratórios subterrâneos
de Física e Astrofísica têm sediado alguns dos
maiores e mais complexos experimentos de
detecção já feitos, contribuindo para importantes
descobertas - algumas delas agraciadas com o
Prêmio Nobel.
Nesta série de reportagens, você irá conhecer um
pouco sobre alguns dos laboratórios mais profundos
da Terra, a 1.000 metros ou mais abaixo da
superfície, que estão cavando profundamente os
segredos do Universo.
O Observatório Kamioka detecta neutrinos
provenientes de supernovas, do Sol, da nossa
atmosfera e de aceleradores de partículas, naturais
ou não.
Em 2015, Takaaki Kajita recebeu o Prêmio Nobel de
neutrinos atmosféricos, o que foi feito usando o
experimento Super-Kamiokande - o Nobel foi
compartilhado com o Observatório de Neutrinos de
Sudbury, no Canadá, que você irá também
conhecer.
O foco original do Kamioka está na compreensão da
estabilidade da matéria, o que está sendo feito
através de uma pesquisa sobre o decaimento
espontâneo de prótons usando um experimento
chamado Kamiokande. Como os neutrinos são um
grande pano de fundo para a observação do
decaimento do próton, o estudo dos neutrinos
também se tornou um grande esforço do
observatório.
Laboratórios subterrâneos têm que começar de alguma forma: Esse contêiner foi a "pedra fundamental" do Stawell. [Imagem: ARC Centre of Excellence for Particle Physics]
O SUPL está em construção na mina de ouro ainda
ativa Stawell, em Vitória, na Austrália. Sua intenção
principal é verificar se a quantidade de matéria
escura em certas galáxias muda dependendo da
posição da Terra.
O laboratório vai trabalhar em estreita colaboração
com o Laboratório Nacional Gran Sasso, na Itália,
que fez avanços significativos na pesquisa da
matéria escura através de uma possível detecção
dos WIMPs.
Como a Austrália está no Hemisfério Sul e tem
estações opostas às da Itália, este efeito sazonal da
matéria escura também irá testar os resultados
obtidos na Itália para obter mais informações sobre
os WIMPs e a matéria escura.
Na segunda reportagem, a ser publicada amanhã,
você conhecerá outros três laboratórios
subterrâneos.
O Segundo artigo foi publicado em 13/07/2016 como Parte II.
Este laboratório subterrâneo fica dentro da mina de
sal e potássio Boulby, na costa nordeste da
Inglaterra.
Seu diferencial é que, em vez de ser um laboratório
dedicado a um tipo específico de experimento, o
Boulby é uma instalação científica multidisciplinar,
operada pelo Conselho de Instalações Científicas e
Tecnológicas do Reino Unido (STFC).
Diagrama do Laboratório Subterrâneo Boulby[Imagem: STFC]
A profundidade e a infraestrutura de suporte tornam
o laboratório multiusuário adequado para estudos
tradicionais subterrâneos com baixo ruído de fundo,
como as pesquisas sobre matéria escura e
experimentos sobre raios cósmicos feitas por
laboratórios astrofísicos dedicados.
Mas os laboratórios também servem a uma ampla
gama de ciências além da Física, por exemplo
Geologia e Geofísica, estudos ambientais e
climáticos, a vida em ambientes extremos na Terra e
o desenvolvimento de robôs espaciais, para a busca
de formas de vida fora da Terra.
Diagrama do Observatório de Neutrinos da Índia. [Imagem: IMSC]
O INO, uma colaboração de cerca de 25 institutos e
universidades indianos reunidos pelo Instituto Tata
de Pesquisa Fundamental, será principalmente uma
instalação subterrânea para a Física de alta energia
sem aceleradores.
O observatório vai concentrar seu estudo nos
neutrinos do múon atmosféricos usando um
calorímetro de ferro de 50 mil toneladas - o maior
ímã do mundo -, para medir características dessas
partículas fugazes.
Posteriormente o INO deverá ser expandido para
uma instalação de ciência mais geral, acolhendo
pesquisas geológicas, biológicas e hidrológicas.
O laboratório Gran Sasso ficou conhecido do grande público com experimentos com neutrinos que poderiam ter superado a velocidade da luz - mas não o fizeram. [Imagem: LNGS]
O Laboratório Nacional de Gran Sasso, na Itália, é o
maior laboratório subterrâneo do mundo. É um
laboratório de Física de alta energia que realiza
vários experimentos de longo prazo com neutrinos,
matéria escura e experimentos astrofísicos
nucleares.
Entre eles, merece destaque o experimento OPERA,
que detectou os primeiros candidatos a neutrino do
tau, que surgiram por meio de oscilações de um
feixe de neutrinos do múon enviados por baixo da
terra pelo CERN, na fronteira entre a França e a
Suíça, em 2010.
Equipes do Gran Sasso também colaboram com o
Acelerador Fermi, dos EUA. Quando atualizado, o
experimento ICARUS do Gran Sasso irá se juntar a
dois outros experimentos no Fermilab para procurar
por um quarto tipo de neutrino, o neutrino estéril.
O terceiro artigo da série foi publicado em 14/07/2016 com o título de Parte III.
A Universidade de Oulu, na Finlândia, opera o
laboratório Cupp dentro da segunda mina mais
profunda da Europa, a Mina Pyhasalmi, de onde são
extraídos cobre e zinco.
Como a mina deverá se exaurir até o final desta
década, a comunidade local criou
o empreendimento
Callio Lab (CLAB), para alugar espaço para
instituições de pesquisas acadêmicas e industriais.
O nível principal, a 1.420 metros de profundidade,
abriga todos os equipamentos, escritórios e
restaurantes - além da sauna mais profunda do
mundo.
O Cupp é um desses inquilinos e seu experimento
principal é o EMMA (Experiment with MultiMuon
Array), projetado para estudar os raios cósmicos e
múons de alta energia que atravessam a Terra, em
busca de uma melhor compreensão das interações
entre as partículas atmosféricas e cósmicas.
O Cupp também realiza algumas medições do fluxo
de múons e faz pesquisas sobre radiocarbono para
os futuros cintiladores líquidos que serão instalados
no laboratório 2, a 1.430 metros de profundidade.
Há múltiplos níveis na mina de Pyhasalmi que poderão ser utilizadas como laboratórios.[Imagem: CUPP]
Pesquisadores brasileiros foram convidados para participar do experimento DUNE sobre neutrinos, que será instalado no Sanford. [Imagem: Sanford Lab]
O Sanford Lab é o mais profundo laboratório de física
subterrâneo dos Estados Unidos e está na antiga
Mina de Ouro Homestake, em Dakota do Sul. Foi lá
que Ray Davis fez sua experiência com neutrinos
solares, que usou um fluido de limpeza a seco para
contar neutrinos do Sol, o que lhe valeu o Prêmio
Nobel de Física em 2002.
O experimento encontrou apenas um terço dos
neutrinos que se esperava, um resultado que passou
a ser conhecido como o "problema do neutrino
solar". Em 1998, o Kamioka e o SNO descobriram
as oscilações dos neutrinos, que provou que os
neutrinos mudavam de um tipo para outro conforme
viajam até a Terra.
A instalação abriga agora o experimento LUX, que
está procurando a matéria escura), o Demonstrador
Majorana, que pesquisa as propriedades dos
neutrinos) e estudos geológicos, de engenharia e
biológicos.
O Sanford Lab também será a sede do DUNE (Deep
Underground Neutrino Experiment), que usará
detectores cheios com 70.000 toneladas de argônio
líquido para estudar neutrinos enviados através da
terra pelo Fermilab, a 1.480 km de distância.
Localizado em Modane, na França, acessível a partir
do meio do túnel rodoviário de Fréjus, o laboratório
multidisciplinar hospeda experimentos em física de
partículas, nuclear e astrofísica, ciências ambientais,
biologia e nano e microeletrônica.
As principais atividades de física fundamental do
Modane Lab incluem o SuperNEMO e o Edelweiss,
que estudam a física dos neutrinos e tentam detectar
a matéria escura, respectivamente.
O laboratório também abriga experimentos
internacionais em colaboração com o Instituto
Conjunto de Pesquisa Nuclear, em Dubna, na Rússia
e com a Universidade Técnica Checa, em Praga.
O quarto artigo foi publicado em 15/07/2016 com o título de IV Parte.
Escondido sob as montanhas do Cáucaso e ao lado
do rio Baksan, o BNO começou a funcionar como
um dos primeiros observatórios de física de
partículas subterrâneos na então União Soviética.
Como outras instalações subterrâneas, o BNO queria reduzir a quantidade de radiação de fundo tanto quanto possível. Para isso, a localização do laboratório não é apenas subterrânea, mas também o mais distante possível de reatores nucleares, outra fonte de ruído de fundo para os experimentos.
Os experimentos de neutrinos atualmente
conduzidos no BNO são o SAGE (Experimento
Soviético-Americano de Gálio), o BUST (Telescópio
Subterrâneo de Cintilação Baksan) e o ainda em
construção BEST (Experimento Baksan em
Transições Estéreis). Há também uma nova busca
por partículas hipotéticas chamados áxions,
candidatos a átomos da matéria escura.
O Brasil participa do Laboratório ANDES, que busca compreender os raios cósmicos e os neutrinos. [Imagem: AndesLab]
Situado nas montanhas na fronteira do Chile com a
Argentina, o ANDES irá estudar neutrinos e matéria
escura, bem como placas tectônicas, biologia,
astrofísica nuclear e o meio ambiente. Junto com o
SUPL, é um dos dois únicos laboratórios
subterrâneos profundos no Hemisfério Sul.
O ANDES é um laboratório internacional, e não
apenas uma série de experimentos internacionais.
Ele se tornará o lar de um grande detector de
neutrinos e pretende detectar neutrinos de
supernovas e geoneutrinos, complementando os
resultados dos laboratórios do Hemisfério Norte.
Sua localização é ideal, já que está longe de
instalações nucleares e ficará bem fundo nas
montanhas, o que ajuda a reduzir o ruído de fundo.
O SNOLAB funciona em uma mina de níquel ainda
em operação em Ontário, no Canadá. A instalação de
5.000 m2 inteira é uma sala limpa classe 2000,
com menos de 2.000 partículas por pé cúbico.
Isto é necessário para os instrumentos altamente
sensíveis que pesquisam a matéria escura e os
neutrinos. Entre eles estão DEAP-3600, PICO,
HALO, MiniCLEAN e SNO+. Os cientistas também
planejam instalar lá o SuperCDMS, a próxima
geração de caçador da matéria escura.
No ano passado, Arthur McDonald foi um dos
descoberta da oscilação de neutrinos - descoberta
feita em 1998 - no Observatório de Neutrinos de
Sudbury, o antecessor do SNOLAB. O Prêmio Nobel
foi compartilhado com o Observatório Kamioka no
Japão, por seu experimento com neutrinos Super-K.
O CJPL (China Jinping Underground Laboratory) é o
laboratório de física mais profundo do mundo,
escondido dentro da montanha Jinping, na província
de Sichuan, no sudoeste da China.
O local é ideal para um baixo fluxo de múons de
raios cósmicos, o que significa que a instalação tem
muito menos ruído por radiação de fundo do que
vários outros laboratórios subterrâneos. E como a
instalação é construída sob uma montanha, há
acesso horizontal (para coisas como veículos) em
vez de acesso vertical (através de um poço de
mina).
Dois experimentos alojados na instalação estão
tentando detectar diretamente a matéria escura: o
CDEX (China Dark Matter Experiment) e o PandaX.
O CJPL também irá observar neutrinos provenientes
de diferentes fontes, como o Sol, Terra, atmosfera,
explosões de supernovas e eventual aniquilação de
matéria escura, na esperança de entender melhor
as propriedades dessas partículas elusivas.
Nos próximos meses, um estudo de física
astronuclear e um protótipo de uma tonelada de um
detector de neutrinos serão instalados no CJPL-II.
Fontes :
J.A.